9/03/2009

História de outra mente.

Reminiscências

Era uma manhã cinzenta, o som das sirenes invadiam seu quarto através do pequeno orifício que havia em sua janela, já nem lembrava mais há quanto tempo ele existia. Sentou-se na cama, ignorando os pálidos raios de luz que insinuavam-se pelo chão. Lembrava-se do sonho, tão real quanto a lembrança que invocava. Quase todas as noites ela revivia as mesmas cenas: morte, sangue, dor, gritos, sirenes, fogo. Mas não naquela noite. Durante o sonho ela revivera o dia em que se despedira de vez de seu amado, e diante de seu túmulo, em meio ao caos de mais um ataque, jurara vingança.
Era uma manhã como aquela, o céu cinzento, algumas gotas de chuva caindo... Lembrava-se de que não havia dormido. Passara a noite toda andando pela cidade, desviando-se de poças de sangue, cadáveres, pedaços de concreto e madeira queimada. Algumas casas - ou o que restara delas - ainda ardiam em chamas, e iluminavam a cidade devastada. Com os pés descalços, machucados, e uma faixa cobrindo metade do braço e toda a mão direita, ela vagou. Um pouco antes da luminosidade surgir no horizonte - apesar da guerra e do caos, ela ainda surgia - parou em frente a um portão de ferro trabalhado, o cemitério. Entrou. Caminhou sem pressa por entre as covas e tumbas, percebendo que aos poucos sua audição voltava. Parou em frente a uma lápide.
- Dois meses...- Disse, ajoelhando-se e removendo alguns pedaços de ferro - destroços de alguma tumba que provavelmente fora saqueada ou atingida. Na lápide, algumas palavras já apagadas, a pedra não estava inteira. Nem os mortos tinham paz.
"Como posso olhar para aquele espaço vazio. Como aprender a suportar a dor que a saudade trás. Como ser humano, eu gostaria de entender. O que me faz suportar a pontada no peito. Como eu consigo lutar contra a vontade de deixar tudo. Como eu consigo suportar a vontade de igualar meu corpo à minha alma, e cortar meu ser em mil pedaços.
Ando pelas ruas esperando que um desastre me tire da rotina que a falta de seu sorriso me impôs. Sinto que poderia explodir e espalhar-me em sangue e carne e lágrimas, pelo chão, e isto não faria diferença. Não me importa estar viva ou morta, ou inteira. Prendo-me a estes sentimentos e luto contra os meus sentidos. Abafo os ruídos do mundo que me cerca, com o som interminável e rouco do seu grito de dor.
Com os olhos fechados para a realidade que me atropela com seu descaso e incompreensão, o que me guia pelas ruas e campos devastados, por entre corpos e estilhaços, é o meu eu inconsciente. Como se minhas pernas ganhassem vida, levando-me até os lugares onde esperam te encontrar. Mas só o que encontram é o mesmo escuro, frio e insuportável espaço vazio.
Meus olhos criam sua imagem, e elas correm até sua presença - ausente. Não há nada lá. Não há nada em lugar algum, e a ausência da sua voz pesa em meus ouvidos; a ausência de seu rosto cega meus olhos e a ausência de seu toque adormece meu tato.
A ausência. Sua ausência... É só o que resta em meu coração."

Sonja* Sonneschein

*Lê-se Sônia.

Um amigo da faculdade está escrevendo uma história, e a Sonja tem base na minha pessoa xD
Estou ajudando a dar um passado para ela... Só o Délio sabe do futuro^^

C.C.

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